domingo, 8 de janeiro de 2012

OS POLICIAIS NO CINEMA (7) CAMILLA LACKBERG

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CAMILLA LÄCKBERG, 
A ESCRITORA DE FJÄLLBACKA
Camilla Läckberg é outra escritora revelação que veio do frio, precisamente da Suécia, caminhando na peugada de nomes como os de Stieg Larsson e Henning Mankell. Portanto no campo do policial, mas afirmando-se como escritora plena, que já é tempo de se julgar os escritores de policial tão bons como os melhores, quando realmente o são.  
Desta escritora que nos agarra desde o seu primeiro volume, conhecemos em Portugal, “A Princesa do Gelo” (Isprinsessan, 2002), “Gritos do Passado” (Predikanten, 2004), "Teia de Cinza" (Stenhuggaren, 2005) e, finalmente, “Ave de Mau Agoiro” (Olycksfågeln, 2006). Estes são apenas os títulos traduzidos para Portugal de uma série de mais de uma dúzia de volumes até ao presente, entre policiais e outros, onde ainda se poderão incluir “Tyskungen” (The Hidden Child, na sua tradução inglesa, 2007), “Sjöjungfrun” (The Drowning, 2008), “Fyrvaktaren” (The Lighthouse”), “Snöstorm och mandeldoft” (The Scent of Almonds), “Smaker från Fjällbacka” (Flavours from Fjällbacka, um livro de culinária), todos de 2009, “Änglamakerskan” (The Angel Maker's Wife), “Fest, mat och kärlek” (Feast, Food & Love”, ambos de 2011, “Super Charlie” (2011), e “The Stranger” (2012). Para os entusiastas de Camilla Läckberg ainda há muito para ler, em futuras edições nacionais, que julgo, como as anteriores, asseguradas pela D. Quixote.
Esta escritora e esta série policial que nos é apresentada ostentam características muito específicas que será interessante sublinhar. Mas, ao contrário do que é normal, antes de falarmos da escritora, aproximemo-nos primeiramente das quatro obras já conhecidas e do respectivo ambiente onde decorrem.
Em “A Princesa do Gelo”, primeiro volume da série, vamos encontrar Erica Falk, de regresso à pequena cidade costeira da Suécia onde nasceu. Os pais morreram, a comunidade encontra-se traumatizada por uma inesperada tragédia. A sua amiga de infância, Alex, é encontrada morta na banheira de casa, com os pulsos cortados e o corpo mergulhado em água congelada. Fala-se em suicídio, mas Erika duvida. Convidada para escrever a evocação da amiga, ela que é conhecida por escrever policiais e biografias de mulheres suecas famosas, vê-se de repente no centro dos acontecimentos e de uma investigação particular que irá partilhar com Patrik Hedström, o policial local que investiga oficialmente o caso. Como sempre nestas circunstâncias, a pacata cidadezinha esconde no passado acontecimentos perturbadores. A cidadezinha é Fjällbacka, terra natal de Camilla Läckberg.
No volume seguinte, “Gritos do Passado”, a acção, funcionando como unidade em si só, vai no entanto recuperar personagens e situações do tomo anterior (o que irá acontecer em toda a série). Voltamos, portanto, a Fjällbacka e ao seu porto, onde um rapazinho irá descobrir, numa manhã de Verão muito quente, o cadáver de uma mulher alemã. A polícia inicia a investigação, percebe que se trata de um crime, mas as coisas complicam-se quando, no mesmo local, surgem mais dos esqueletos. Quem conduz o inquérito é o inspector Patrick Hedström, com todo o cuidado possível para não afugentar os turistas durante a época alta. Patrick, é bom que se saiba, juntara entretanto os trapinhos com Erika, e esta encontra-se em casa, grávida, à espera do primeiro filho. Contrariada com a inacção. Por isso decide intervir, pesquisando informações na biblioteca local, o que traz novas revelações, descobrindo-se que os esqueletos são seguramente de Mona e Siv, duas jovens desaparecidas há mais de vinte anos. Uma outra jovem desaparece e tudo parece apontar para mais um crime.  A família Hult, já nossa conhecida de “A Princesa do Gelo”, volta ao palco maior dos acontecimentos, com o seu patriarca, Ephraim, demagogo maior, e os seus dois filhos, Gabriel e Johannes, que se dizem dotados de poderes curativos, a levantarem largas suspeitas. Tanto mais que a família se encontra dividida por rivalidades antigas, que explodem em ódios indisfarçáveis.
"Teia de Cinzas" é o volume seguinte, este passado no Outono. Curiosa a importância que o tempo e a paisagem ocupam na literatura policial nórdica, uma tradição que já vinha das artes plásticas e que se acentuou no seu cinema, quer seja sueco, dinamarquês, norueguês. 
Fjällbacka continua a ser o cenário: um pescador que recolhia ovos de lagosta recupera do mar o corpo sem vida de uma jovem. Pensa-se num fatal acidente. Patrick Hedstrom volta a ser chamado para desencadear a investigação e reconhece de imediato que se trata de Sara, filha de Charlotte, uma amiga da família. Erika, em casa, não consegue atinar com a sua nova condição de mãe de um bebé chorão que não deixa dormir ninguém. Nem com a presença da sogra opinativa. Quando se procede, porém, à autopsia, descobrem-se cinzas na boca da defunta, cinzas essas que começam a surgir na boca de várias outras crianças de Fjällbacka, inclusive em Maja, a filha de Erika e Patrick, que são assim ameaçados na sua própria intimidade. Aparecem vizinhos desavindos, velhos caturras, e revelações cada vez mais suspeitas. Estamos bem. Estamos no interior de mais uma história de suspense de Camilla Läckberg.
O que volta a suceder em “Ave de Mau Agoiro », quarto e último título publicado em Portugal até ao momento. Mais uma vez uma vítima que parece causada por um vulgar acidente de viação, está no desencadear da intriga. Uma vez mais é Patrick Hedström que é enviado para o local do acidente, para tomar conta da ocorrência. Entretanto, os habitantes de Tanumshede, que fica muito perto de Fjällbacka, regozijam-se por a sua cidade ter sido escolhida para cenário de um “reality show” que fez sucesso noutras localidades e que promete levar o nome da cidade a todo o país, durante várias semanas televisivas. Uns poucos acham os concorrentes uns idiotas que só pretendem uns dias de fama, muito álcool e sexo em abundância para oferecer em directo ao voyeurismo dos telespectadores, mas a maioria da população passa-se com o acontecimento. Os media não largam o centro municipal, os jovens apinham-se para ver os silicones de Barbie e os peitorais de Uffe.
Acontece que o corpo da vítima do acidente pertence a Marit, que vive um relação lésbica, e a autopsia afiança que o grau de alcoolemia ultrapassa todos os limites do possível. O que é estranho numa pessoa que não bebia. Mais estranho ainda é a morte de uma das concorrentes, a Barbie que nunca terá sido muito popular entre os colegas, e aqui a investigação de dois crimes começa a assustar a esquadra local, dirigida por Mellberg, um incompetente megalómano.
Ora bem, chegados aqui já conhecemos um pouco o ambiente usual em que decorrem os romances de Läckberg. Uma pequena cidade costeira da Suécia, um casal como personagens centrais, Patrick, polícia, e Erika, escritora de policiais, os pequenos e grandes dramas de uma esquadra de província, as intrigas e os mexericos provincianos, a vida do dia a dia, que um ou vários crimes alteram por momentos. Tudo muito quotidiano, com as investigações policiais a serem entrecortadas por descrições caseiras da vida dos habitantes de Fjällbacka, oscilando entre a esquadra e os lares, entre o insólito que procura resolução, e o normal que tende à continuidade. Lá fora está o calor desmedido ou o frio rigoroso, há o presente e o passado, com uma escrita muito ágil, viva, sem floreados, atenta e atraente. Começa-se a ler um romance e não se pára. 
Ora o curioso é a relação de Camilla Läckberg, a quem chamam “a nova Agatha Christie que vem do frio”, com as suas histórias. Vamos, portanto, falar um pouco da escritora. Nasceu no dia 30 de Agosto de 1974, em Fjällbacka, na Costa Ocidental da Suécia, a cerca de 140 km de Gotemburgo. Cidade histórica, que data do século XVII, é zona pesqueira e turística, com cerca de mil habitantes residentes, e multidões no Verão.
Camila formou-se em Economia, pela Universidade de Gotemburgo, trabalhou como economista em Estocolmo, frequentou um curso de escrita criativa de policiais e mudou de vida. Ela já gostava de policiais desde criança, devorava livros e escrevia desde os cinco anos, e, em 2003, quase a entrar nos trinta, lançou “A Princesa do Gelo”. Três anos depois batia recordes de vendas na Suécia e pouco depois era traduzida em 32 países. Em 2009, foi a sexta escritora mais lida na Europa. Em Julho de 2010, casou-se com Martin Melin, que nos dizem um mediático oficial da polícia, muito conhecido do público da Suécia por ter participado num “reality show”, “Survivor”, em 1997. Ele ajuda-a a escrever os seus livros, oferecendo-lhe os conhecimentos do dia a dia da esquadra, a que ela corresponde com a erudição própria de uma mulher casada, mãe de três filhos. Deste caldo de culturas nascem as obras que deliciam leitores de todo o mundo. Certamente porque há muito de vivido, de autêntico, de genuíno naquilo que ela escreve, muitas vezes seguramente com algo de autobiográfico. Entre a realidade do documento e a imaginação da ficção. Mais um pormenor: tem três filhos: Wille, Meja e Charlie. Meja? Onde é que eu já vi um nome tão parecido?
Ganhou vários prémios literários, entre os quais o “Folket” em 2006, e, no ano seguinte, alguns romances seus começaram a ser adaptados à televisão. “Isprinsessan” e “Predikanten”, em 2007, “Stenhuggaren” em 2009, “Olycksfågeln” em 2010, e “Fjällbackamorden: Havet ger, havet tar”, em conclusão, para emissão durante 2012. Produção sueca, os dois primeiros realizados por Jonas Grimås, o terceiro e o quarto dirigidos por Emiliano Goessens, o próximo terá a assinatura de Marcus Olsson. Elisabeth Carlsson (Erica Falck) e Niklas Hjulström (Patrik Hedström) são os protagonistas dos quarto primeiros telefilmes, e Claudia Galli (Erica) e Richard Ulfsäter (Patrick) anunciam-se para o próximo. 
Mas muito mais se espera deste universo tão sedutor para adaptar ao cinema.

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