sexta-feira, 21 de junho de 2013

OS POLICIAIS NO CINEMA (10): JO NESBO E OS" CAÇADORES DE CABEÇAS"

JO NESBO 
E “CAÇADORES DE CABEÇAS”

1.JO NESBØ

Jo Nesbø é norueguês. Escritor de policiais, foi corrector de bolsa, jornalista, e ainda vocalista e compositor da banda pop Di Derre. Hoje em dia, é um dos escritores nórdicos de maior sucesso. Dele li tudo o que se encontra traduzido para português, e tornei-me num dos seus leitores compulsivos. Da série Harry Hole, um curioso inspector de polícia, cuja existência literária se inicia em 1997, com “Flaggermusmannen”, a que se segue, em 1998, “Kakerlakkene”, conheço “O Pássaro de Peito Vermelho” (Rødstrupe, 2000), “Vingança a Sangue-Frio” (Sorgenfri, 2000), “A Estrela do Diabo” (Marekors, 2003) e “O Redentor” (Frelseren, 2005), recentemente lançado em Portugal pela sua editora de sempre, a D. Quixote. Existem mais quatro volumes da mesma série a aguardar tradução: “Snømannen” (2007), “Panserhjerte” (2009), “Gjenferd” (2011) e “Politi” (2013). Para lá desta série policial, Jo Nesbø escreveu ainda livros infantis, integrados igualmente numa série, Doktor Proktor, de que se conhecem cinco títulos, e ainda outros romances e novelas, como “Karusellmusikk” (2001), “Det hvite hotellet” (2007), e “Caçadores de Cabeças” (“Hodejegerne”, em inglês “Headhunters”, 2008), este último igualmente policial, mas independente da série do inspector Harry Hole.            
Jo Nesbø é um excelente escritor, unanimemente considerado como tal. Não é só um talentoso escritor "de policiais", mas um romancista de têmpera, que levou o New York Times a dizer que a Noruega já tinha dado homens como Henrik Ibsen e Edvard Munch mas também o escritor de bestsellers Jo Nesbø”. A CNN, por seu lado, vai mais longe, mas na mesma perspectiva: “O próximo Munch ou Ibsen pode ser Jo Nesbø … e, se existir alguma justiça, um dia destes Harry Hole será tão grande como Harry Potter”. Como se pode perceber, trata-se de um escritor bem cotado, numa altura em que o policial nórdico impera no campo literário e começa a ombrear com as produções norte-americanas, no plano televisivo e cinematográfico.
A mãe era bibliotecária, o que certamente levou Nesbø a interessar-se desde muito cedo por literatura, mas os estudos não lhe corriam de feição, preferindo a prática de futebol, tendo-se tornado jogador profissional do Tottenham Hotspur FC e depois do Molde FC. Afastou-se do desporto quando alguns problemas do joelho o forçaram a abandonar a carreira. Cumpriu o serviço militar no norte da Noruega, enquanto estudava. Começou a tocar numa banda de garagem chamada I De Tusen Hjem, ingressando depois na banda Di Derre. Entretanto, iniciou a actividade como corrector da bolsa, de que se fartou rapidamente. Viajou para a Austrália, pouco tempo depois de uma editora o ter convidado a escrever um livro. Começou a escrever o romance “Flaggermusmannen” durante o voo para a Austrália e, quando regressou a Oslo, trazia a obra na bagagem. Enviou o manuscrito para a editora Aschehoug, sob o pseudónimo de Kim Erik Lokker, procurando que a sua relativa fama como músico não interferisse no processo de avaliação da obra. O livro foi um sucesso e alcançou prémios como “Rivertonprisen” (melhor romance policial da Noruega) e “Glassnøkkelen” (melhor romance policial da Escandinávia). Os seus sucessivos trabalhos ganharam diversos prestigiados galardões e uma popularidade imensa. “Snømannen”, por exemplo, vendeu 160 000 exemplares na primeira semana nas livrarias. Até meados de 2008, Nesbø tinha conseguido vender mais de meio milhão de livros só na Noruega e estava traduzido em cerca de quarenta línguas. Em 2009, Nesbø foi agraciado com o prémio de reconhecimento pelo público da revista “Dagbladet”, pois tinha três dos seus títulos no top da lista de romances mais vendidos na Noruega.

Tem recebido vários convites para a série Harry Hole ser adaptada ao cinema e à televisão, mas tem afirmado que não gostaria que isso acontecesse antes de a mesma estar concluída. “Caçadores de Cabeças”, todavia, não fazendo parte deste grupo acabou por ser realizado em 2010, por Morten Tyldum, com Aksel Hennie no papel principal. Curiosidade adicional: os direitos de autor do livro, bem assim como os lucros que o filme reúna, serão doados à Fundação Harry Hole, que ajuda crianças, em países em desenvolvimento, a aprender a ler e escrever.

2. ALGUNS ROMANCES DE JO NESBØ
O mais recente livro de Jo Nesbø a chegar a Portugal, em tradução, é “O Redentor”. Como (quase sempre) passado em Oslo, desta feita durante um inverno gelado. Numa movimentada rua da capital norueguesa, o Exército de Salvação dá um concerto de Natal, quando subitamente se ouve um estrondo e um dos elementos do Exército cai, fulminado por um tiro à queima-roupa. Harry Hole, o inspector, é chamado ao local, com a sua equipa, e não encontra nada a que se agarrar, nem suspeito, nem arma do crime, nem móbil. Em paralelo, vamos acompanhando a fuga do assassino, que rapidamente percebe que não acertou em quem devia, mas sim num irmão com muitas semelhanças. Sabe-se que vem da Sérvia, a guerra da Bósnia paira sobre todo este ambiente pesado e, à medida que se vê cada vez mais cercado, o fugitivo enfrenta as agruras do frio nórdico, da ausência de dinheiro, da falta de um local para se abrigar, da solidão, da presença cada vez mais próxima do perspicaz Harry Hole.

Mais uma vez o crime, a política internacional, as instituições religiosas estão na base deste trabalho empolgante, onde perpassa igualmente um curioso retrato da sociedade norueguesa. 

Os outros títulos da série Harry Hole já traduzidos para português são “O Pássaro de Peito Vermelho”  (2000), “Vingança a Sangue-Frio” (2000) e “A Estrela do Diabo” (2003). No primeiro destes três a acção volta a decorrer em Oslo, mas Harry Hole, que se percebe ter sido um alcoólico, em recuperação e recentemente transferido para o Serviço de Segurança Pública, é encarregue de vigiar Sverre Olsen, um neonazi corrupto que escapou à condenação devido a um pormenor técnico, o que transporta a intriga para os derradeiros dias da II Guerra Mundial. Por entre traições, vinganças, assassinatos que ameaçam multiplicarem-se, confundindo tempos históricos, a batalha de Leninegrado, os nazis noruegueses e os skinhead da actualidade. 

“Vingança a Sangue Frio” mantém o mesmo tipo de intensidade dramática e o suspense que caracteriza a escrita de Nesbø. Desta feita, tudo começa com um “hold up” invulgarmente violento: através das imagens das câmaras de vigilância vê-se um homem a entrar num banco de Oslo e a apontar uma arma à cabeça da mulher que se encontrava na caixa, exigindo que esta conte até vinte e cinco. Como não consegue o dinheiro a tempo, executa friamente a jovem caixa, e leva consigo dois milhões de coroas norueguesas. O inspector Harry Hole é o elemento destacado para investigar o caso. Entretanto, Harry debate-se com problemas pessoais. Enquanto a namorada viaja até à Rússia, uma antiga paixão regressa e entra em contacto com ele. Anna Bethsen, artista que enfrentava dificuldades financeiras, convida Hole para jantar, este não consegue resistir ao convite, mas a noite termina de uma forma estranha e, ao acordar, Hole sente uma fortíssima dor de cabeça, descobre o seu telemóvel desaparecido, e perdeu a memória do que se passou nas últimas doze horas. Para agravar a situação, Anna é encontrada morta na sua cama, com um tiro na cabeça, e o inspector recebe e-mails ameaçadores. Obviamente alguém está a tentar culpá-lo por esta morte inexplicável, enquanto os assaltos a bancos prosseguem com incomparável brutalidade.

Ainda da série Harry Holle é “A Estrela do Diabo”, com Oslo a sufocar numa onda de calor. Neste verão tórrido, uma jovem é assassinada no seu apartamento, apresentando um dedo cortado e, debaixo de uma pálpebra, descobre-se um pequenino diamante vermelho com o formato de um pentagrama. Harry Hole e Tom Waaler, um colega em quem ele não confia, são chamados para tomar conta do caso. Tom faz jogo duplo, trabalha para um bando de traficantes de armas, e Harry desconfia que está implicado no assassinato da sua antiga parceira de armas. Harry continua com problemas com o álcool, debate-se com os seus superiores, e este caso é uma bóia de salvação. Dias depois, outra mulher é dada como desaparecida, surgindo um dedo dela cortado e adornado com um diamante vermelho com a forma de uma estrela. Percebe-se que há um serial-killer à solta. Desmascarar Tom Waaler, e deitar a mão ao assassino são duas prioridades que se descobrem interligadas e que põem em risco de vida o próprio inspector. 



3. HEADHUNTERS - CAÇADORES DE CABEÇAS


Finalmente, o derradeiro romance de Nesby em edição portuguesa é “Caçadores de Cabeças”, que não tem Harry Hole como protagonista, mas sim Roger Brown, um “caçador de cabeças”, ou seja de talentos que descobre para colocar em empresas de sucesso. Mas é também um sedutor ladrão de obras de arte. Casado com Diana, uma “belíssima, alta e elegante” dona de uma galeria de arte, vive num apartamento luxuoso, leva uma vida bem acima das suas posses, e aproveita-se dos conhecimentos da mulher e dos contactos que faz para engendrar a troca de originais preciosos por cópias sem valor.
Numa inauguração da galeria, a mulher apresenta-o a Clas Greve, um holandês riquíssimo e bem colocado na vida, e Harry percebe que não pode deixar escapar aquela oportunidade. Clas Greve não é apenas o candidato perfeito ao cargo de director-geral que ele tem de recrutar para a Pathfinder, como ainda tem em seu poder o famoso quadro de Rubens, “A Caça ao Javali de Caledónia”. Este seria um golpe que o deixaria independente economicamente. Mas nem tudo corre bem e Jo Nesbø oferece-nos uma perturbadora panorâmica sobre o mundo da alta finança, das grandes empresas, da elite industrial e de um submundo larvar de assassinos contratados e burlões.


“Caçadores de Cabeças” é a única adaptação ao cinema que conhecemos de uma obra de Jo Nesbø, apesar de já existirem outras e de se anunciar que um remake desta mesma está já a ser produzido por estúdios norte-americanos, para ser dirigido pelo inglês Sacha Gervasi, o mesmo que escreveu o argumento de “Terminal de Aeroporto”, de Spielberg, e que realizou o recente “Hitchcock”. Fala-se igualmente na possibilidade Martin Scorsese vir a rodar um filme retirado de uma outra obra de Nesbø.
“Headhunters”, realizado por Morten Tyldum, numa produção da Noruega e da Alemanha, conta com Aksel Hennie como intérprete da personagem de Roger Brown, um excelente actor que consegue dar espessura e credibilidade à figura e erguer sobre ela este policial que, não sendo uma obra-prima, se mostra todavia bastante eficaz de um ponto de vista de escrita, bem doseado em suspense e habilmente fotografado, fazendo sobressair a luz fria dos países nórdicos, que confere ao mesmo uma tonalidade azulada e metálica que se coaduna bem com o ambiente pretendido.
O filme não consegue a qualidade do romance, sobretudo no tom de discreta mas verrinosa ironia anti-établissement que Jo Nesbø lhe inculca, mas satisfaz as necessidades do entretenimento inteligente e elegante, muito embora algumas cenas mais sangrentas de um epílogo um pouco fantasioso, mas vibrante. Outros actores, como Nikolaj Coster-Waldau (Clas Greve) e Synnøve Macody Lund (Diana Brown), asseguram uma competência de representação muito boa, o que só vem dignificar a qualidade dos trabalhos oriundo deste país, e que ombreiam com outros de diversos países nórdicos.
Se a literatura policial por estas bandas desencadeou um boom de interesse público a nível mundial, não é menos verdade que as suas cinematografias conseguem acompanhar este entusiasmo num nível de produção industrial que nada fica a dever à dos países anglo-saxónicos. Para já não falar da produção cinematográfica de autor, que é bastante importante e significativa nesta última década, com a revelação de novos nomes e de obras extremamente sugestivas. 

4. FILMES RETIRADOS DE OBRAS DE JO NESBØ:

DEADLINE TORP (TV) 
Realização: Nils Gaup (Noruega, 2005); Argumento: Nils Gaup, Håkan Lindhe, Jo Nesbø, Segundo ideia de Dag Erik Pedersen; com Danilo Bejarano, Emil Forselius, Jørgen Langhelle, Sverre Anker Ousdal, etc.

FERDIG MANN
Realização: Søren Kragh-Jacobsen (Dinamarca, Noruega, 2010); Argumento: Jo Nesbø (poema); com  Abdulahi Abdikafi, Mohammad Abdullah, Mohamed Adel, etc. 6 minutos.


HEADHUNTERS - CAÇADORES DE CABEÇAS
Título original: Hodejegerne
Realização: Morten Tyldum (Noruega, Alemanha, 2011); Argumento: Lars Gudmestad, Ulf Ryberg, segundoo romance de Jo Nesbø; Produção: Anni Faurbye Fernandez, Marianne Gray, Lone Korslund, Christian Fredrik Martin, Paul Røed, Asle Vatn, Mikael Wallen; Música: Trond Bjerknes, Jeppe Kaas; Fotografia (cor): John Andreas Andersen; Montagem: Vidar Flataukan; Casting: Jannecke Bervel; Design de produção: Nina Bjerch Andresen; Guarda-roupa: Karen Fabritius Gram; Maquilhagem: Stuart Conran, Rick Marr, Jim Udenberg; Direcção de produção: Trond Mjøs; Assistentes de realização: Martin Ersgård, Nina Samdal; Departamento de arte: Monja Wiik; Som: Tormod Ringnes; Efeitos especiais: Mark Hedegaard, Hummer Høimark, Claus Nørregård; Efeitos visuais: Lars Erik Hansen; Companhias de produção: Friland, Yellow Bird Films, Nordisk Film, ARD Degeto Film; Release Date: Intérpretes: Aksel Hennie (Roger Brown), Nikolaj Coster-Waldau (Clas Greve), Synnøve Macody Lund (Diana Brown), Eivind Sander (Ove Kjikerud), Julie R. Ølgaard (Lotte), Kyrre Haugen Sydness (Jeremias Lander), Valentina Alexeeva (Natasja), Reidar Sørensen (Brede Sperre), Nils Jørgen Kaalstad (Stig), Joachim Rafaelsen, Mats Mogeland, Gunnar Skramstad Johnsen, Lars Skramstad Johnsen, Signe Tynning, Nils Gunnar Lie, Baard Owe, Sondre Abel, Morten Hennie, Irina Eidsvold, Kyrre Mosleth, Martin Furulund, Mattis Herman Nyquist, Torgrim Mellum Stene, Camilla Augusta Hallan, Anjum Salwan, etc. Duração: 100 minutos; Distyribuição em Portugal: Vendetta Filmes; Classficação etária: M/ 16 anos, Estreia em Portugal: 13 de Junho de 2013.

ARME RIDDERE
Realização: Magnus Martens (Noruega, 2011); Argumento: Magnus Martens, segundo ideia de Jo Nesbø; com Kyrre Hellum, Mads Ousdal, Henrik Mestad, etc.

I AM VICTOR (TV) 
Realização: ??; (EUA, 2013)
Argumento: Mark Goffman, segundo romance de Jo Nesbø; com John Stamos, Matthew Lillard, Josh Zuckerman, Lorenza Izzo, etc. (em produção).

DOKTOR PROKTORS PROMPEPULVER

Realização: Arild Fröhlich (Noruega, 2014); Argumento: Johan Bogaeus, segundo obra de Jo Nesbø; com Eilif Hellum Noraker, etc. (em produção).